A chuva que caía sem parar naquele melancólico fim de tarde, até parecia querer dizer que o céu também chorava com aquela desconsolada mulher. Seus olhos no buraco, 35 anos, boca pálida e trincada, e cabelos em total desalinho combinavam bem com o visual descuidado daquele vestido escuro, sem estampas. Na mão esquerda, um amarrotado lenço azul escuro, encharcado de lágrimas. Aquela mulher desfaleceu, quando vieram fechar para sempre a pequenina urna branca, com o corpo de seu filhinho, todo coberto de rosinhas cor-de-rosa. Era um velório mudo e todas, absolutamente todas, as pessoas que ali estavam carregavam olhos vermelhos de tanto chorar. Quando todos saíram da sala do velório em cortejo, nada mais restou no lugar a não ser o cheiro forte de flores tresnoitadas, velas queimadas e aquela mãe de olhos fundos, amparada por duas mulheres. A de olhos verdes a mão fria da mãe partida ao meio e disse-lhe:
- Eu sei que nada, querida, do que eu lhe disser agora lhe trará consolo... muito menos o seu filho de volta, mas gostaria que você, apesar desse momento de tanta dor, pensasse sobre uma coisa. Passe a observar como as mães do mundo animal reagem tão diferentes de nós, animais racionais, quando perdem um filhote...
A mulher com os olhos no buraco perguntou sem levantar a cabeça:
- Como elas reagem?
- Por não serem racionais como a gente, a reação delas é bem menos complicada..., talvez menos dolorida... talvez até sem nenhuma dor... Comece a observar e você também verá...
E você, já observou como parece reagir indiferente uma fêmea do mundo animal, quando perde um de seus filhos? Uma boa leitura.