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ANO 41 - Nº 2051
20/12/2024


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FALA, LEITOR! Lei Maria da Penha completa 4 anos - 24/09/2010

Não se pode compactuar com a violência de qualquer natureza. Mas a agressão doméstica e familiar machuca mais profundamente, porque parte das pessoas que amamos. Agride o corpo, a consciência e a alma. Você pode superar, e até perdoar, mas não pode esquecer. Para que não se repita. Ainda menina, vi meu pai espancar minha mãe, e ela revidar como podia. O pau quebrava lá em casa, desde sempre. Não era exclusividade da nossa família. Menina já bem crescida, procurava desculpas para atenuar a responsabilidade de meu pai naqueles episódios, que jamais saíram de dentro de mim. Amava muito meu pai e o perdi muito cedo, ainda pirralha. Cresci lutando entre o amor e a memória. E o meu amor e a minha meninice me impediam de dimensionar a realidade. Naquele tempo, não havia delegacia específica, e não haveria por anos a fio. Não havia, também, movimento de mulheres nem campanhas anti-violência. Nem lei que, bem ou mal, se reportasse ao assunto. Muito menos notícia no jornal. O poder familiar ao macho pertencia, e a ele cabia dispor de sua fêmea como bem se lhe aprouvesse. Certo dia, após mais uma sessão de agressões verbais, psicológica e pancadaria, minha mãe resolveu dizer bata! Foi até a delegacia mais próxima e denunciou meu pai. Apresentou-se ao delegado usando uma fralda da filha mais nova, ainda bebê, para estancar o sangue da orelha quase decepada na luta corporal com o marido. Estava grávida de 7 meses, do 4º filho. Essa imagem, com certeza, foi decisiva para a autoridade policial meter a colher. O ano era 1958. Meu pai foi preso. Passou alguns dias no xilindró para esfriar a cabeça e refletir sobre os próprios atos de covardia. Jamais me esqueci da cena de meu pai atrás das grades, quando minha mãe decidira ir-se embora com os filhos e nos levou para nos despedirmos dele. Na minha cabeça de menina, aquilo era um acontecimento. Em certo sentido o era, mesmo, naquele tempo e lugar. Só muito mais tarde, pude compreender a gravidade daqueles fatos e a importância dos gestos, e atitude, todos, de minha mãe. Aprendi que amor e resistência não são incompatíveis, ao contrário, se complementam. Amor com dor é uma rima pobre e de mau gosto. Medo se supera. A recusa, a compaixão e o afeto podem andar juntos com a dignidade e o respeito. Minha mãe amou meu pai até o último suspiro. Morreu viúva, 40 anos depois que ele partiu. Mas jamais o esqueceu. Jamais se omitiu ou escondeu sua história. Era sua maneira de nos educar. Certamente, boa parte da mulher

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