MEIRELES NÃO ACEITA RECEBER APENAS R$ 1MILHÃO DOS 10 QUE A CIDADE VAI RECEBER DE MULTA
No dia 3 de fevereiro, foi feita, pela Vale, a entrega da adutora do rio Pará ao município. Como as obras da adutora atrasaram-se para ser entregues, foi feito um acordo entre essa empresa e o MP - Ministério Público de pagar uma multa ao município, já com destino pré destinado. Para saber mais e informar bem, a reportagem GP conversou com o promotor Delano Azevedo. Confira.
“A previsão de conclusão das obras da adutora era 10 de julho de 2020, mas houve um atraso muito grande e ela só ficou pronta em 3 de fevereiro deste ano. Dessa forma, calculamos a multa, apresentamos à Vale e, após tratativas e negociação, chegamos ao valor de R$ 10 milhões, que será depositado pela Vale, num prazo de 15 dias, na conta do município. Esse valor deverá ser aplicado, da seguinte forma, conforme havia sido concordado, antes, com o prefeito, secretários e o procurador: * R$ 1 milhão na aquisição de vacinas contra a covid; * R$ 1 milhão em obras elencadas, no acordo feito na comunidade de Meireles, como reforma da escola, posto de saúde, velório e praça municipal; e * R$ 8 milhões na criação e revitalização de lagoas no meio urbano, desassoreando, criando lagoas, implantando pistas de caminhada no entorno, iluminação, gramado, durante 2 anos, no mínimo. É um acordo que foi bom para o município, para a Vale, colocando um fim nessa discussão, que poderia desenvolver-se judicialmente e isso demoraria alguns anos. O M P abrirá um procedimento administrativo para acompanhar a aplicação desse recurso, com o município prestando conta ao M P a cada 3 meses,” comemora Delano.
E AS RUAS DANIFICADAS DE MEIRELES? - “(...) A Vale fez um arquivo fotográfico, antes de intervenção e é importante deixar bem claro que é uma intervenção, sendo impossível não ficar nenhuma marca do calçamento anterior, onde se abriram valas de 1M, 1M½ e meio para colocar uma adutora de 600MM. Então, será impossível ficar como era antes. Mas queremos que seja próximo, o máximo possível, de como era antes, mas a cicatriz vai ficar. O MP não terá o preciosismo para tirar essa cicatriz. A adutora não passou só por lá. Em todo lugar ficou a marca dela.”
REAÇÃO IMEDIATA - No dia seguinte à ação do promotor, a reportagem GP recebeu uma Carta Aberta, enviada pelo empresário Rodrigo Campos, residente em Meireles. Confira.
“A Comunidade de Meireles vem se posicionar em relação ao acordo com o Ministério Público, sobre a destinação de parte da multa pelo atraso da entrega da nova adutora e a respeito de outras questões correlatas. 1°, cabe o registro que nenhuma gota d'água da nova adutora chegará às torneiras dos moradores do povoado de Meireles, que é abastecido por um poço artesiano local. A comunidade de Meireles não foi consultada se concordaria ou não com tal obra e se os moradores estariam dispostos a se submeter aos seus inconvenientes. Ela se viu envolvida num problema causado por um 3°, a Vale S.A., por conta da sua comprovada irresponsabilidade, inclusive, na qual é reincidente, e por decisão do poder executivo municipal sobre a qual não teve sequer a chance de opinar feita para evitar maiores gastos à Vale para não assumir custos de indenização aos proprietários de terrenos nos quais a adutora poderia passar sem gerar os transtornos que causou à comunidade. Os moradores viram sua vida simples e pacata ser transformada numa rotina de canteiro de obra com barulho de máquinas pesadas, tráfego de caminhões gerando poeira que invadia as casas causando problemas de saúde para crianças e idosos, interdições de estradas (muitas delas sem aviso prévio), testes malsucedidos da adutora (realizados também sem aviso), a presença de centenas de pessoas sem nenhum vínculo com a comunidade, entre outros inconvenientes. E por mais impressionante que isso possa parecer, nada disso foi considerado no Termo de Compensação que foi firmado pelo município com a Vale. Nenhuma compensação foi prevista para a comunidade na qual se concentrou boa parte da obra. E agora se questiona o pleito da comunidade de Meireles em relação a ter o que se tinha antes da obra. Se não bastasse isso, tanto a Vale, quanto a Bueno Engenharia e Construção Ltda., sua terceirizada, mantiveram com a comunidade de Meireles uma relação descuidada, marcada pela omissão. Quando procurada, a Bueno informava apenas cumprir ordens da Vale, que por sua vez se omitia em prestar qualquer tipo de esclarecimento ou assistência à comunidade. Não se tem registro na comunidade de Meireles da presença do prefeito, ou dos seus secretários, ou até mesmo de fiscais da prefeitura, durante todo o período de execução da obra da nova adutora. Não foi uma obra rápida, feita em poucos dias, era conhecido por seu planejamento que iria durar meses e ela ainda atrasou a sua conclusão por mais de 220 dias. Assim, não pode o município alegar falta de tempo, ou de conhecimento sobre o planejamento do qual participou (ou deveria ter participado ativamente), ou de oportunidades de se fazer presente, ou até mesmo para atender demandas colocadas pela comunidade. O incomodo fato é que a comunidade não se sentiu amparada. Os exemplos são abundantes. Citamos o episódio do surto de covid-19 provocado por funcionários da Bueno que transitavam pelo povoado sem usar EPIs - Equipamentos de Proteção Individual, o que havia sido relatado por um vereador numa reunião da câmara meses antes do surto a partir de denúncias de moradores. Na ocasião do surto, uma comitiva de moradores se dirigiu à prefeitura em busca de ajuda. A comitiva foi impedida de participar da reunião com a Vale, na qual a questão seria tratada e quando teve um representante incluído “a contragosto” sendo orientado a manter-se calado e convidado a se retirar da reunião quando tentou fazer as considerações da comunidade. Mas a Vale e seus representantes mereceram por parte do município o tratamento deferente ao qual os cidadãos de Pará de Minas, moradores de Meireles, não receberam. Especificamente, sobre a reparação, a comunidade registrou em documentos protocolados junto ao Ministério Público suas preocupações e descontentamento quanto aos danos causados ao calçamento e às estradas de acesso que foram impactadas pela abertura de valas e tráfego de veículos pesados e máquinas pesadas. Não se pode alegar desconhecimento, nem falta de tempo para tratar essas questões postas ainda em tempo de execução da obra. Sobre as declarações do promotor de justiça Delano Azevedo Rodrigues, a quem a comunidade tem em alta conta por reconhecer seus esforços e empenho, esclarecemos que não se trata de “cicatrizes”, mas de danos maiores, visíveis para qualquer leigo e possíveis de serem notados apenas por uma simples visita aos locais, mas que certamente podem ser facilmente comprovados por qualquer especialista que tenha mínimo compromisso com a qualidade. Para verificar as más condições das estradas de acesso, basta entrar num carro e seguir até o povoado. Os buracos do calçamento foram tampados porcamente com terra compactada que será removida com facilidade na primeira chuva. Esses reparos não foram fiscalizados por quem caberia cumprir esse papel que é o município. Não existe relatório emitido por fiscais ou agentes da prefeitura, ou registros fotográficos, que comprovem a boa execução desses serviços. De outra parte, são muitos os registros feitos por moradores da Comunidade que demonstram a má execução dos reparos no calçamento. Não deve haver por parte da promotoria de justiça dúvida sobre o que diz tanto o Termo de Compromisso firmado no âmbito do Inquérito Civil MPMG 0471.19.000016-9, quanto no Termo de Recebimento Provisório assinado em fevereiro de 2021, no qual consta: A questão que se coloca não é a economicidade dos reparos para a Vale não se trata de uma empresa sem recursos. A comunidade de Meireles não pode ser ainda mais penalizada. Quanto a viabilização da destinação do valor de 1 milhão de reais para ações de compensação, a comunidade não tem dúvida que se não tivesse se mobilizado nada teria recebido. O descompromisso da Vale era evidente. Não havia também por parte do município qualquer iniciativa ou ação nesse sentido. O MP, a quem a comunidade atribui o mérito da a viabilização do acordo, teve que mudar a destinação da multa que inicialmente somente poderia ser aplicada em obras de recuperação de mananciais. A comunidade não deve, não pode e não vai se conformar em receber menos do que tem direito. Espera que o MP continue a cumprir o seu papel na defesa de direitos dos cidadãos e dos interesses da sociedade, o que se registra tem feito até então com primazia. A comunidade de Meireles reconhece os esforços do MP e, especialmente, do promotor de justiça Dr. Delano Azevedo Rodrigues, sendo que a divergência pontual em relação ao calçamento e estradas de acesso ao povoado de nenhum modo compromete tal entendimento. Espera-se ainda que o município assuma também sua responsabilidade e que não deixe sobre os ombros de cidadãos o papel que lhe cabe cumprir por dever de ofício.”
O OUTRO LADO - Procurada pela reportagem GP, veja a resposta enviada a este jornal, pelo departamento Relacionamento com a Imprensa da Vale.
“A Vale informa que a definição do uso dos recursos é prerrogativa do poder público e do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). Cabe ainda destacar o compromisso assumido pela empresa para entrega das vias não pavimentadas em melhores condições que aquelas encontradas antes do início das obras, assim como da entrega das vias pavimentadas em condições no mínimo idênticas àquelas registradas também antes do início das obras. Necessário reafirmar também que todos os municípios afetados pelo rompimento da Barragem B1 receberão valores contemplados no Acordo Global assinado junto ao Governo de Minas, em fevereiro deste ano, para implantação das medidas compensatórias. Os valores investidos no novo sistema de captação no rio Pará ultrapassaram o montante previamente pactuado no Termo de Compromisso, o que reforça o compromisso da empresa em realizar a entrega de um produto de alta qualidade à população de Pará de Minas. A Vale reafirma seu compromisso com o processo de reparação dos impactos causados, ressaltando a entrega da nova adutora em elevado nível como um destes marcos.”