Após ser condenado a 80 anos de prisão na madrugada desta quarta-feira (13), o traficante Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, embarcou no Aeroporto Santos Dumont por volta das 8h em um avião do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) da Polícia Federal com destino à Catanduvas, no Paraná, onde continuará preso.
Beira-Mar pegou a pena máxima por crime de homicídio qualificado ocorrido em 2002. A sentença foi lida no início da madrugada desta quarta, pouco depois da 0h30, pelo juiz Murilo Kieling, após ouvir decisão do júri presente no Tribunal de Justiça (TJ), no Centro do Rio, onde o julgamento foi realizado a partir das 14h de terça (12). Logo após o anúncio, o próprio Beira-Mar disse que vai recorrer.
Beira-Mar, de 45 anos, terá que cumprir a sentença inicialmente em regime fechado, segundo o juiz. A pena foi dividida em 30 anos por cada homicídio, dos também traficantes Antônio Alexandre Vieira Nunes e Edinei Thomaz Santos, e mais 20 anos por tentativa de homicídio, de Adaílton Cardoso de Lima, que sobreviveu. O criminoso é acusado de ordenar os assassinatos de dentro da penitenciária de segurança máxima Bangu 1, onde estava preso na época. Os executores não foram identificados.
Segundo o TJ, antes do julgamento, as condenações de Beira-Mar apenas no Rio somavam 69 anos e meio de prisão. No total, considerando também outros estados, eram 120 anos. Com o veredito desta terça, a soma vai a 200 anos. O traficante está preso desde 2002.
"Seus predicados pessoais e a predileção por atividades ilícitas renderam-lhe frutos. Ganhou status de maior criminoso nacional. A maldade bebe na maior parte o veneno que produz", disse o juiz durante a leitura da sentença.
O promotor Marcelo Muniz Neves ficou satisfeito: "Dificilmente há coragem por conta do magistrado de impor a pena máxima. Mas, por conta das circunstâncias, não tinha como ser de outra maneira. Acho que dentro do que é possivel foi alcançado o que se pretendia".
Sorriso e beijos na entrada
Na chegada ao plenário do 4º Tribunal do Júri, escoltado por quatro agentes do Departamento Penitenciário Federal, a serviço do Ministério da Justiça, Beira-Mar, de óculos de grau, tentou esconder as algemas, sorriu, acenou e mandou beijos para parentes e amigos. O criminoso chegou de helicóptero de Bangu 1, onde passou a noite após a chegada ao Rio nesta segunda-feira (11) — ele cumpre pena na Penitenciária Federal de Catanduvas (PR).
O interrogatório começou às 15h. Antes, a defesa pediu a suspensão da sessão porque nenhuma das seis testemunhas compareceu. A promotoria, por sua vez, disse que não seria necessário ouvi-los, e o juiz decidiu prosseguir com o julgamento, e perguntou se o réu usaria o direito de permanecer em silêncio. Beira-Mar preferiu responder.
O juiz perguntou, então, se o réu teria ordenado os homicídios. "Não, de forma alguma", respondeu. "Tanto que eu mandei socorrer o Adaílton, que era meu olheiro", disse sobre o sobrevivente, que desapareceu após o crime e foi uma das testemunhas ausentes no julgamento.
O traficante afirmou que apenas ordenou a realização de uma reunião na favela Beira-Mar, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, para esclarecer uma guerra que estava acontecendo entre traficantes da comunidade. Nesta época, segundo ele, a ordem foi dada por meio de um dos telefones celular que ficavam à sua disposição em Bangu 1. De acordo com o réu, durante o encontro, o criminoso conhecido como Pepito teria se descontrolado e atirado a esmo, matando inclusive inocentes.
Estudante de teologia
O traficante contou também que iniciou a faculdade de teologia, à distância, e que só não está trabalhando porque a prisão de Catanduvas não oferece esse tipo de serviço.
Questionado pelo MP sobre o interrogatório anterior, em que negou ter conhecimento das mortes e que não se tratava de sua voz nas escutas telefônicas, Beira-Mar admitiu que mentiu para não produzir provas contra si mesmo. "Na época, eu tinha uma outra visão de vida. Estou sofrendo bastante e quero pagar o que devo à Justiça", disse o traficante, acreditando que quem tiver acesso às escutas telefônicas perceberá que não partiu dele a ordem para os homicídios.
As gravações a que se refere foram feitas pela Polícia Federal em 2002, e mostram Beira-Mar conversando com subordinados por telefone, de dentro da cadeia. Sons de tiros são registrados no áudio gravado, como mostraram reportagens do "Fantástico" e do "Jornal Nacional", da TV Globo, exibidas no julgamento a pedido do promotor Marcelo Muniz Neves.
Após 1h30min de tese da acusação, foi dada a palavra à defesa, por volta das 18h10. O advogado Wellington Correa sustentou que as escutas telefônicas não tinham autorização judicial e, por isso, a prova seria ilícita. "Luiz Fernando da Costa é uma pessoa notoriamente perseguida pela imprensa, mas tem direito a ampla defesa. Não há autorização judicial nesse processo", disse.
Após o fim do debate entre acusação e defesa e novo intervalo, a sessão foi retomada por volta das 20h, com a réplica do MP, seguida da tréplica da defesa. Por fim, os sete integrantes do júri se reuniram por cerca de uma hora, até o juiz anunciar a sentença, à 0h30.