Está sendo discutido em Brasília/DF, a Pec 37/2011 que trata de uma proposta de emenda constitucional, a partir de uma interpretação da constituição, cujo objetivo é atribuir com exclusividade à Polícia Federal e Militar o poder de fazer investigações criminais. Os outros órgãos públicos podem ainda estar realizando denúncias, o que também é direito do cidadão, mas caso a Pec 37 seja aprovada, todos eles perderão o direito de investigação. A reportagem GP esteve com Renato de Vasconcelos Faria, 33, promotor de justiça da área criminal que deu o seu parecer sobre o assunto. Confira.
“A investigação criminal sempre foi feita no Brasil por várias instituições: Banco Central, Receita Federal, Coaf, Cad e, principalmente, pelo Ministério Público, que sempre teve essa função e vocação de fiscalizar o poder e as aplicações dos recursos públicos e as atividades políticas e parlamentares. O objetivo dessa proposta de emenda constitucional é tirar esse poder de investigação do Ministério Público e de várias outras instituições, dando-o exclusivamente para a força policial. Isso demonstra um retrocesso à medida que a investigação criminal, ao contrário de ser restringida, deveria ser abrangida. Ao cidadão de bem que cumpre seus deveres com o país, não interessa subtrair esse poder de investigação. Interessa subtraí-lo para quem comete delitos. Infelizmente, a classe política, detentora dos poderes, secularmente vêm violando a sociedade, furtando os cofres públicos. Somente à essa classe interessa restringir o poder que o próprio Estado tem de investigar e levar ao tribunal os responsáveis por esses crimes. Hoje, não se fala em outra coisa, a não ser o Mensalão, fruto de um trabalho de várias instituições que, juntas, investigaram e fizeram algo inédito no Brasil, levando à cadeia todo esse grupo de mensaleiros”, aponta o promotor Renato.
MINISTÉRIO PÚBLICO E IMPRENSA - “Em um sistema democrático, não há sentido restringir uma investigação, uma vez que o que interessa à sociedade é que criminosos sejam punidos. Não desvalorizando a competência da polícia no Brasil, mas ela já enfrenta vários problemas financeiros e de falta de pessoas qualificadas para o trabalho. O Ministério Público quer também estar apto a investigar crimes mais complexos como os de origem financeira e tributários, e também, da própria polícia. Em Pará de Minas, já tivemos casos em que o Ministério Público investigou policiais, a pedido da própria polícia, que foram levados a responder processos criminais. Quanto mais instituições houver para investigar o poder público, melhor. A função da mídia, por exemplo, é muito similar ao do ministério público, pois denuncia à população e fiscaliza o poder público. Todos os dias, quando abrimos os jornais, ouvimos o rádio e lemos revistas, podemos ver este trabalho de fiscalização, levando esses fatos criminosos à população. Quem pune é o Poder Judiciário, mas sempre provocado por outras instituições. O que o Congresso Nacional quer, é clarear os termos da constituição para dizer que algo estava dito, quando na verdade não estava. Trata-se de uma interpretação desviada da constituição. O que eu peço é que o leitor da GAZETA, a sociedade pará-minense em geral tome conhecimento deste assunto e que opinem. Não quero que ninguém concorde comigo. Quero apenas que conheçam a situação e tirem as suas próprias conclusões. A população, ainda que sem poder de decisão, possui o poder do apelo popular, o que faz muito efeito, pois os políticos precisam do povo para ser reeleitos. Quando há cobrança popular, as respostas vêm”.
Os promotores Charles Daniel França Salomão e Delano Azevedo Rodrigues também falaram com a reportagem GP. Confira.
BRASIL OU VENEZUELA? - “Qualquer um que precisa da atuação dos órgãos da polícia, passa por algum tipo de frustração de não ter atendimento à sua investigação. Não é demérito aos profissionais que lá trabalham, mas há uma estrutura precária da polícia civil e o Ministério Público, de forma supletiva, se vê obrigado a fazer a investigação em determinados crimes, principalmente os que envolvem a participação dos políticos e policiais, desvio de verbas públicas de alto valor, em que a polícia não tem o preparo técnico para isso. Nesse caso, é necessária a atuação do Ministério Público. Essa exclusividade que se pretende dar à polícia civil e federal é extremamente nociva ao interesse público na atuação de diversos crimes que acontecem corriqueiramente em nosso país. Seria muito cômodo para o Ministério Público deixar essa Pec ser aprovada e deixar seu serviço ser diminuído. Mas nós estamos aqui para defender a sociedade e o Estado democrático, de olho em algo muito maior: a democracia forte. E ela depende de um judiciário forte, do Ministério Público forte e da imprensa livre. As mudanças acontecem paulatinamente e se nos calarmos hoje é o Ministério Público; e amanhã será a imprensa. Essa Pec é um sinal quase vermelho para transformar o país em uma futura Venezuela”, alerta o promotor Delano.
IMPARCIALIDADE - “Devemos ressaltar que, diferentemente do Ministério Público, que é uma organização autônoma e independente, a polícia é subordinada aos governadores e prefeitos. Resumindo, o Ministério Público é muito mais imparcial do que a polícia”, desafia o promotor Charles.