Entre estrondos, poeira e medo. Por um bom tempo, em 2011, era assim que a cuidadora de idosos Maria da Penha Barbosa vivia em Natividade, no Noroeste do Rio de Janeiro. Da janela de casa, ela acompanhava a evolução das obras e via o verde diminuir e os barrancos aumentarem. “Sempre tinha explosões para quebrar as rochas e passar o mineroduto. Tremia tudo, tinha medo de o teto cair. A casa ficou toda rachada”, conta. E não foi só com dona Penha. Várias outras casas do bairro Parque Lajinha sofreram as consequências das detonações. A Anglo American fez indenizações, mas nem todos já receberam, e alguns, como o lavrador Claunício Lourenço Dias, 59, não ganharam o suficiente. “A casa ficou cheia de rachaduras. Eles me pagaram R$ 2.500, mas não dá para consertar tudo, porque foi muito pouco. Até hoje ainda estou arrumando”, afirma Dias. Ele conta que, sempre que tinha uma detonação, os moradores eram avisados e levados para uma creche. “Mas, até de lá, a gente ouvia o barulho e sentia os tremores.”A detonação de explosivos e a emissão de ruídos ganharam um capítulo no estudo encomendado em 2011 à consultoria Diversus pelo Ministério Público Federal de Conceição do Mato Dentro, para mensurar os impactos da obra do mineroduto. Embora o levantamento tenha se baseado em casos somente nas cidades mineiras de Conceição, Dom Joaquim e Alvorada de Minas, pesquisadores confirmam que é um reflexo do que acontece ao longo dos 525 km do mineroduto.
“A detonação de explosivos gera incômodos, como a emissão de ruídos, e há suspeita de que residências e prédios históricos, principalmente na sede do distrito de Córregos, estão sofrendo rachaduras como decorrência desse tipo de procedimento”, atesta a pesquisa. O estudo, que cita o Parecer Único do Sistema Estadual de Meio Ambiente de Minas Gerais (Sisema) de 2008, reconhece os danos e a precariedade das soluções. “O EIA-RIMA (estudos de impactos) desconsiderou que os efeitos para a saúde humana podem ser mais prejudiciais ainda”, comprometendo até mesmo a acuidade auditiva das pessoas”, diz o estudo.
Maria da Penha viu sua saúde ser abalada após a obra. “Eu ficava muito nervosa, e minha pressão subia demais. Na minha opinião, em vez de indenizar a gente, o melhor era comprar as nossas casas para não termos que passar por isso. Eu até tentei vender para mudar daqui, mas ninguém quis comprar”, desabafa.
Penha recebeu R$ 7.000. O vizinho dela, Anderson Manuel da Silva, 37, não recebeu nada. No caso dele, o problema foi maior do que as rachaduras. “Estava construindo, e o alicerce já estava todo pronto, e eu tinha investido uns R$ 13 mil. Eles vieram pra negociar comigo, me ofereceram uma mixaria, e eu não aceitei. Aí eles depositaram R$ 8.000 em juízo e derrubaram o que eu já tinha construído. Isso foi em 2009, e, infelizmente, nunca vi a cor desse dinheiro”, conta Anderson.
A Anglo reconhece que as detonações provocaram rachaduras em algumas propriedades e afirma que, nos casos comprovados que os danos foram causados por impactos do projeto Minas-Rio, os proprietários foram indenizados. Na época, a prefeitura de Natividade chegou a questionar o licenciamento do mineroduto junto ao Ibama, mas a obra continuou.
As rachaduras não são o único reflexo da obra do projeto Minas-Rio na cidade fluminense. Atualmente, o Ministério Público Federal estuda uma alternativa para amenizar os danos ambientais. O procedimento foi aberto no MPF de Itaperuna (RJ), que abrange Natividade. Mas foi remetido ao MPF de Belo Horizonte porque essa unidade já avalia outros processos relacionados a danos provocados pelo mineroduto. “Recebemos relatos de assoreamento, supressão de mata e problemas com água em Natividade. Estamos levantando os dados para a tomada de decisão”, anuncia o procurador da República José Adércio Leite Sampaio.
Fonte: O Tempo