Quem vê o sorriso que Maria Rosalina da Conceição, de 80 anos, carrega no rosto não imagina “as pedras” que ela encontrou no meio do caminho. Ela teve que ser forte para lidar com a morte de 13 filhos e de dois maridos, um deles assassinado pelo próprio genro. A história dela, segundo os próprios familiares, é digna de ser relembrada e, ao mesmo tempo, eternizada.O G1 conversou com a aposentada um dia após o aniversário de 80 anos e ela detalhou os momentos que fizeram com que se transformasse na pessoa que é hoje. Ela contou que se casou muito nova, aos 13 anos de idade. Vivia na Paraíba e passava por dificuldades financeiras. “Morava no norte do estado e minha vida era muita ‘custosa’, pobre e difícil. Perdi meus pais na infância. Eu e minhas sete irmãs tivemos que ‘nos virar’ para viver”, disse.
Foram 28 anos de casamento e 21 filhos, sendo que 13 deles morreram, a maioria por falta de recursos na área da saúde. “Como era raro médicos na nossa região, as crianças iam adoecendo e acabavam morrendo. Não existia vacinas como existe atualmente e a assistência médica deixava muito a desejar. É difícil falar sobre isso, pois a dor de perder um filho é difícil de descrever. A cada morte, um pedaço de mim também morria”, lamentou.Da Paraíba, Maria Rosalina e a família foram se aventurar em Quirinópolis (GO) e foi na cidade goiana que o casal conseguiu um “pedaço de chão”, como retratou a idosa. “Com o nosso trabalho, compramos uma terra para plantar e tirar o nosso sustento. Mas foi nessa mesma terra que meu marido deu o último suspiro. Um dos meus genros, pensando na herança, assassinou meu amor a facadas. Ele foi preso e pouco tempo depois, por desgosto e depressão, minha filha, esposa do assassino, acabou tirando a própria vida”, contou.
Depois dessas perdas, a vida de Maria Rosalina ficou mais difícil, mas ela não deixou que os acontecimentos destruíssem o que restou. Ela teve que aprender a encarar novas tarefas e ainda se desdobrar para cuidar dos filhos.Após o luto e com o passar do tempo, ela encontrou um novo amor. Maria Rosalina se apaixonou por um funcionário que trabalhava com ela e passaram a morar juntos. Como ele tinha cinco filhos em Uberlândia, ela acabou se tornando “mãe” deles e mudou para a cidade mineira. “A vida parecia ter recomeçado. Estava ao lado dos meus filhos e construindo uma nova vida, mas nesse intervalo tive uma grande decepção. Meu novo marido foi vender minhas terras em Goiás para comprarmos algo em Minas e acabou gastando todo o dinheiro. Fiquei sem nada. Como ele era uma boa pessoa, acabei perdoando. Juntos, nós criamos as crianças, casamos os filhos e até cuidamos dos netos que ganhamos. Vivemos um tempo bom, mas um dia ele sentiu uma forte dor no peito e me deixou”, disse.
Após a morte do segundo marido, Maria Rosalina decidiu seguir a vida sozinha, sem namorados. Ela começou a fazer coisas que não fazia, como dançar e praticar atividade física. “Eu me dei a chance de me redescobrir e foi aí que a felicidade voltou a bater na minha porta. Hoje me considero uma pessoa feliz e com a vida que eu pedi a Deus. Sou aposentada e aproveito meu tempo livre para estar ao lado das pessoas que gosto”, salientou.O G1 conversou com algumas pessoas que conhecem Maria Rosalina e participaram de alguma forma dessa história. O filho Vanderley Francisco Alves, de 43 anos, contou que vê a mãe como uma verdadeira guerreira. Ele disse que mesmo com as dificuldades que ela enfrentou, criou os filhos com amor, dedicação e ainda os ensinou a serem pessoas honestas. “A sua determinação foi para mim uma grande lição de vida”, disse.
A filha caçula, Ivanete Maria da Conceição Silva, de 42 anos, contou que vê na mãe um exemplo, uma referência. “Apesar de tantas perdas, lutas e sofrimentos, ela nunca desistiu, desanimou. Eu nunca vi minha mãe ficar remoendo o passado, ficar lamentando as perdas de filhos, maridos ou bens materiais. Ela sempre viveu o presente, com muita luta, garra, fé, sem pergunta o porquê das coisas, sem se lamentar”, ressaltou.
O outro filho, João Batista Filho, de 50 anos, disse que vê na mãe uma amiga, que chora com as tristezas e sorri com as alegrias da família. João Batista acrescentou que a mãe tem um coração que não cabe no peito. “Lembro bem das lutas dela, do trabalho pesado no cabo da inchada, das roupinhas que ela mesmo fazia e remendava para nós. Das paneladas de comida que ela mesma preparava com todo cuidado e capricho para nos alimentar. Graças a ela aprendi a não desistir e acreditar que não existe vitória sem luta”, afirmou.A filha Iracema Maria da Conceição, de 57 anos, também relembrou alguns caminhos percorridos pela mãe. “Lembro bem de nossa infância difícil. Ela acordava cedinho para ir para roça trabalhar e eu ficava com meus irmãos bebezinhos para ajudá-la. Ela sempre foi mãe coruja e esposa amiga, companheira e carinhosa. Só fazia as refeições junto de meu pai e eles eram literalmente almas gêmeas. Até hoje mamãe chora ao falar do papai”, confessou.
Iracema ainda acrescentou que a mãe é muito vaidosa, adora perfume, maquiagem, brincos e de estar com uma roupa bonita. Segundo a filha, destes gostos ela foi privada enquanto jovem, devido a vida difícil que passou.
A nora Edilaine Rodrigues Pinto Alves, de 36 anos, também é fã de Maria Rosalina. E diz que desde que conheceu a sogra tem vivido um constante aprendizado. “Nunca presenciei ela falando mal de quem quer que seja. Ela não reclama da vida dura que passou e fala do passado de uma maneira ímpar, sem mágoas e sem ressentimentos. Das coisas tristes que passou, ela ainda sempre consegue tirar algo de bom em tudo. Ela tem uma imensa vontade de viver”, concluiu.
Fonte: G1