Desta vez, a reportagem GP entrevistou Cristovão José de Oliveira, 100 anos, que nasceu em Passa Tempo/MG, filho de João José de Oliveira e Ana Luiza do Nascimento, casado há 68 anos com Lourdes Maria de Oliveira, 84 anos, com quem teve 9 filhos: José, Nelson, Romeu, Walter, Gérson, Marta, Rosângela, Maura e o já falecido Celma com 15 anos de idade. Não deixe de ler.
“Eu gostava demais de trabalhar. Teve uma época que eu levantava a meia-noite e meia, comia arroz com feijão e ia apanhar laranja no pomar que ficava na beira do rio, em Florestal/MG, para levar até Juatuba/MG. Eu chegava lá às 6H. Era bem difícil. Eu levantava e pegava o carro de boi. Naquela época, não tinha luz, nem estrada e eu ia naquela estrada ruim e escura, assim mesmo. Éramos 5 irmãos, havia 3 mais velhos que eu. Meu pai não deixava a gente colocar sapato oara não escorregar na hora de subir no carro ou cair debaixo dos bois... Mas, por causa da friagem e da geada que sempre caía branquinha, meus pés rachavam, saia sangue... era aquela mexida. Depois, qualquer serviço que aparecia eu topava. Enfrentava inchada, foice, tudo. Não tinha o que eu não fazia. Adolescência eu praticamente não tive pois trabalhei o tempo todo. Depois, trabalhei fichado, puxando lenha de metro. Trabalhei 2 anos afiadinho sem falhar um dia. Era chuva, era sol e eu estava no meio do mato. Quando chovia muito, ia arrastar a lenha para fora da mata. Quando estiava, ia puxar a lenha de metro no carro de boi. Eu não acredito que teve outro homem que mexeu com carro de boi mais do que eu. Isso foi a minha vida toda. Antigamente, o povo era bobo demais... trabalhava, a bem dizer, dia e noite. Com 73 anos, mudei para Pará de Minas, parei de mexer com carro de boi, mas ainda tenho ele até hoje. Tenho um carrinho (de boi) pequeno, pendurado no meu quarto. Quero que coloquem ele no caixão, quando eu morrer, para levar de recordação”, afirma o centenário Cristóvão.
DANÇAR? NEM VER! - “Teve um dia que nós fomos no Centro dos Idosos. Aí, vieram duas lotações de Itaúna com uma mulherada danada. Tinham só 7 ou 8 homens. O resto era tudo mulher. Eu me sentei num banco atrás da porta que dá para a rua. Aí, elas passavam para dançar e falavam: Oi, sô Zé! Aí passou outra e falou: Oi, Zé, tá bom? Eu respondi que estava bom, mas com a cara fechada (riso). Quando interou a 3ª, pensei: Vou sair com essas mulheres na cabeça. Quando interou a 4ª, eu falei: Dançar para quê? Aí, ela disse: Porque é bom! Aí, eu falei: Dançar era bom, quando a gente era novo e não tinha oportunidade de conversar com as moças, a não ser dançando. Dançar agora, nem ver”...
O MUNDO DE HOJE – “No meu tempo de solteiro - eu me casei com 32 anos - pintou no pedaço para mim 14 namoradas. Quando eu acabava com uma, mandava recado para a outra ir lá em casa para eu conversar com ela. Aí, a gente ia andando de papo com a namoradinha, quando, de repente, tropeçava num lugarzinho qualquer e esbarrava um no outro e pedia desculpa, falava perdão... Hoje, pensa que isso está diferente, não tenho nem comentário. Velho como estou, vejo tantas vaidades... Fico triste e penso: coitado de quem tem família grande”!
O PAI ERROU - “Eu não tenho muita tristeza na minha vida, graças a Deus, porque sou alegre. Adoro cantar música antiga. Antigamente, quando eu saía para passear, meu pai falava comigo: Lá vai tomar friagem. Você vai viver pouco! Ele morreu com 78 anos e eu já estou com 100. Ele falou besteira (risos). Eu sou católico, graças a Deus, e fico muito feliz, me sinto muito bem, quando, todo dia, trazem comunhão para mim. Tive 9 filhos, mas um morreu... Era o caçulinha e faleceu com 14 aninhos. Depois, vieram me dizer que a causa foi diabetes. Já fizeram 38 anos que ele faleceu”.
MENSAGEM FELIZ – “No fim da entrevista, Cristóvão disse que queria deiixar uma mensagem sobre carro de boi e cantou uma canção de Tião Carreiro e Pardinho. Cantou assim: “Fui um herói sem medalha na profissão de carreiro, puxando tora do mato com 12 bois pantaneiros. Eu ajudei a desbravar o nosso sertão brasileiro. Sem vaidade, eu confesso, do nosso imenso progresso: Eu fui um dos pioneiros. Quando eu vi meu boi carreiro, não contive a emoção. Meus olhos encheram d’água e o pranto caiu no chão”.